top of page

Sofia A. Carvalho

 Programa em Teoria da Literatura, FLUL

No extremo da mão, a mão acesa – o punho – é uma lâmpada: A criação poética como tautologia em António Ramos Rosa”

 

O poema só pode ser entendido a partir de si mesmo,

porque em si mesmo se origina e o seu fim é ele próprio.

António Ramos Rosa

 

O carácter heterodoxo e revolucionário da criação poética em António Ramos Rosa assume preponderância hermenêutica na prosa ensaística do Autor. Ora, o conjunto da sua prosa ensaística, ainda que temporalmente amplo e afastado, concentra aquilo que considero ser em António Ramos Rosa a linha crucial do que se possa entender por criação e fenómeno poéticos. Neste sentido, esta proposta visa problematizar, num primeiro momento, o modo de acontecer da criação poética a partir do princípio da tautologia, conforme referenciado na epígrafe: o momento da criação – o da produtividade do texto e do seu sentido – refere-se à materialidade do próprio texto. Este princípio comporta na poética rosiana uma lúcida chave de leitura que guiará esta reflexão, tal como elucida o Autor: «O poema (texto) não exprime o real anterior, qualquer coisa dada, um acontecimento – ele é o próprio acontecimento –, porquanto, na sua tensão para o imaginário, para o que não existe ainda, realiza o movimento que se apropria do real, que o produz.» (Poesia, Liberdade Livre, 1986: 34-35). Num segundo momento, e partindo da “criatura autónoma” que é o poema, pretende-se analisar as linhas de força da sua “tessitura verbal”, tal como intentadas e pensadas pelo Autor: a sua densidade própria e vital, o paradoxo em que se encontra cerzido e a apreensão literal do seu sentido ou não-sentido. Estas linhas ganharão corpo crítico no confronto entre as figuras do autor, do leitor e do crítico. Por conseguinte, o terceiro momento reflexivo prende-se, justamente, com a proposta rosiana de uma poética da «infinita potencialidade da linguagem», cujas plurisignificação e ambiguidade não excluem «a univocidade significativa do poema total que é tautologicamente ele mesmo e cujo modo específico da afirmação não é o da significação dada, mas o da significação que se dá sem se esgotar, isto é, a significação criadora.» (Poesia, Liberdade Livre, 1986: 49). Em suma, far-se-á uma exegese do processo poético, entendido como uma espécie de encarnação da palavra ou revelação fenomenológica da imaginação, que deve ser estudado a partir de si mesmo, porquanto “[...] o poeta não existe senão pelo poema, pois não existe um estado poético prévio ou permanente: é o próprio poema que o eleva à condição poética, que o faz poeta”.

Sofia A. Carvalho é doutoranda do Programa em Teoria da Literatura [FLUL-UL 2016]. Bolseira de Doutoramento [FCT 2017], com uma proposta de trabalhos sobre Teixeira de Pascoaes. Mestre em Estética e Filosofia da Arte [FLUL-UL 2008]. Licenciada em Filosofia [UCP, Lisboa, 2003]. Publicou estudos e ensaios, sobretudo, nas áreas da filosofia e da literatura. Presidente da Comissão Organizadora do Triénio Pascoalino [2014 | 2015 | 2017], tendo coordenado três volumes de ensaios sobre o pensamento e a obra de Teixeira de Pascoaes [2017] e comissariado cientificamente a exposição “Pascoaes: do Solar de Gatão ao Universo” realizada na Biblioteca Nacional de Portugal [Fevereiro a Maio, 2017].

bottom of page